As festas Popscene e Gente Bonita voltam a se reunir no Clube Glória. Na edição que rola nesta terça (16), os DJs residentes Flávia Durante e Hector Lima, Alexandre Matias e Luciano Kalatalo, recebem os DJs Guab e Chernobyl - nosso entrevistado da semana
Eduardo Ribeiro, textoMarcelo Nunes, foto
Fredi Endres, mais conhecido por seu codinome de guerra Chernobyl, é DJ, produtor, guitarrista da banda Comunidade NinJitsu e pioneiro no mash-up de funk carioca - a despeito de ser gaúcho - com rock. Na atividade desde 95, Chernobyl e sua banda faziam isso quando muitos ainda torciam o nariz, e, de lá pra cá, desde quando ficaram conhecidos por causa do hit "Detetive", evoluíram junto com a tendência que virou realidade.
A Comunidade acaba de lançar seu sexto álbum, Atividade na Laje, e ele também vive um momento promissor de sua carreira. Depois de uma proveitosa turnê pela Europa, está envolvido em sua segunda colaboração com o Bonde do Role (que lança disco novo em 2009), em janeiro embarca em outra tour no Velho Continente e promete a realização de um álbum autoral, além das costumeiras edits, como uma de suas próximas investidas.
Se você ainda não conferiu o som do cara ao vivo, ainda está em tempo. Nesta terça-feira (16) ele mostra todo seu talento ao público de São Paulo, no Clube Glória. Pra se ter idéia daquilo que Chernobyl usa como combustível na hora de incendiar as pistas, ele liberou uma mixtape pros leitores do Skol Beats baixarem - é só clicar aqui. A entrevista que vocês acompanham a seguir foi concedida na tarde da última quinta-feira de calor a pino, dentro de um restaurante na Oscar Freire. Uma caipirinha, por favor!
Quando começa a chamada onda neo-funk e o que ela tem de novo que a onda funk dos anos 90 não tinha?Eu acho que a grande diferença é que existem... Bem, o divisor de águas é que a galera começou a fazer música em casa de uns tempos pra cá, com a popularização do computador e do software. Uma galera que cresceu ouvindo rock, e de uns tempos pra cá música eletrônica. E acabou fazendo um funk da sua maneira, de uma forma diferente. Então eu acho que a diferença é o background desse pessoal fora do Rio que faz funk. Normalmente é um povo que cresceu ouvindo rock, e a galera do Rio é a raiz do funk mesmo. O neo-funk, ele tem influência do funk carioca, mas feito por gente que ouviu AC/DC, que ouve Soulwax, electro também. Mas os próprios DJs do Rio estão diversificando o set quando vão tocar no exterior porque o público de lá tem que se identificar, né?! Tanto que o pessoal tem feito mash-ups e bootlegs com Justice, com Black Sabbath. Neo-funk na verdade é um rótulo que a gente tentou dar pra explicar. Surgiu quando eu fui fazer uma coletânea pra Som Livre. Eu pensei "cara, que nome que vou dar pra esse funk 'não do Rio'", e eu tava trabalhando com todo mundo que vinha lançando funk fora do Rio, principalmente o Bonde do Role. Daí tem um selo lá na Alemanha, o Man Recordings, que chamou de pós-baile funk. Enfim, neo-funk, pós-baile funk, é tudo o mesmo.
E é legal que rola uma troca de influências, né?! Entre o pessoal que fazia esse funk "tradicional" e a nova escola, digamos assim, que traz as batidas do hard rock e do electro pro "movimento"...Eu acho que é interessante quando as coisas se espalham. Não é legal as coisas ficarem entocadas só no seu lugar de origem. Sany Pitbull é um cara super cabeça aberta. Faz baile funk há 23 anos e ele super troca idéia comigo já faz mais de dois anos. Faço música e mando pra ele, ele manda as dele pra mim. Os artistas mais cabeça aberta, como ele, são os caras que conseguem expandir realmente.
O funk antigamente era visto como algo tosco, essencialmente marginal, e agora já começa a ganhar tratamento cool nas matérias por aí, depois da ascensão do Bonde, do Diplo, do guetto-tech, do Sany Pitbull e até do João Brasil com aquela mixtape dele toda em cima de bases já manjadas do batidão e que ficou demais...A galera que tá perdendo o preconceito é a mais indie e mais electro. Quando eu toco em lugares com DJs de house eu tenho que maneirar no funk. O pessoal naquela vibe raver não assimila muito. Eles querem set mais instrumental e mais fritado. Eu nunca faço um set puro de funk. Faço mil mash-ups e bootlegs, e às vezes quando eu gosto de uma música, faço um remix só pra tocar. Nem lanço nem nada. Mas sempre misturando tudo... Era isso que você ia perguntar, né?! (risos).
Acho que sim (risos)... Bom, todo esse interesse que tá rolando agora é muito devido a uma coisa que a sua banda iniciou, em 95, depois quando surgiram com o hit "Detetive" em 97, esse lance de se arriscar na mistura do funk do morro com guitarra, enquanto que outros nomes do crossover, que faziam funk-o-metal, eram mais rapcore. Vocês estavam no meio desse cenário?Não, a gente só tinha relação com o De Falla que é o pai de todos. Eles são de uma geração mais velha que a gente e eu gostava muito de De Falla na adolescência. Mas eles só foram fazer funk carioca com rock depois da gente. Porque o Edu K produziu nosso primeiro disco e três anos depois ele fez "Popozuda". Muita gente achava que esse som era da Comunidade NinJitsu no sul. E o hit "Popozuda", de certa forma, foi um divisor de águas. Tinha umas guitarras pesadas e tal. Eu acho que a Comunidade foi pioneira, mas super sem querer. A gente respeitava o funk carioca, achava legal, era a batida do funk da Flórida lá, do Miami Bass, um rap muito discriminado nos Estados Unidos, que nunca foi muito bem-sucedido, só que a gente adorava. E a Comunidade nasceu disso, do funk carioca com Miami Bass da Flórida, cantado em português, e com guitarra. A gente já gostava de mistura, aquela coisa dos anos 90, Faith No More e tal, só que estávamos meio de saco cheio desse lance funk-o-metal, e o nosso funk não foi o rap, foi o funk carioca. Funk carioca com metal. Aí a gente acabou criando uma parada. Tanto que dez anos depois, eu vi o MySpace do Bonde, eles tinham duas semanas, e pensei "esses caras têm a mesma despretensão do começo da Comunidade". Aí fiz contato com eles, não conhecia pessoalmente, eles tinham uma demo, e falei: "Vamos gravar direito isso aí, vamos fazer a história".
Você acha que existe uma estética diferente pro funk original da favela e o funk que está invadindo as pistas?Eu acho que ainda existe. O pessoal que compra CDs tipo as coletâneas do DJ Marlboro, esse público não está consumindo o neo-funk. Eles continuam no tradicional. Agora, o que tá acontecendo é que o batidão tá invadindo a cena indie e a cena electro.
Qual será a aceitação do Bonde do Role nas favelas?Eu realmente não sei do público, mas posso falar dos artistas. Os DJs de funk do Rio que eu conheço acham muito legal, eles vêem como uma forma de expansão do ritmo. Algo positivo, de misturar com outros gêneros. A turma que eu conheço não tem preconceito com o fato de ficar pop, Sany Pitbull, Edgar, Amazing Clay, que é um cara das antigas, os caras são cabeça aberta e não é a toa que são eles que tão excursionando direto pela Europa.
Você curte esse tipo de som desde moleque?Eu sempre gostei da música black e do rock. Do começo dos anos 80, eu curtia os primeiros raps, Run DMC, 2 Live Crew...
...e você já tocava guitarra?Eu toco guitarra desde 85, desde que eu tinha 10 anos. E aí eu curtia as duas coisas, mas o batidão mesmo veio aparecer com a Comunidade. E eu logo comprei sampler, eu lido com programação antes do tempo de ter computador em casa. Era uma trabalheira desgraçada, dava muito mais trampo fazer som em casa, mas eu já fazia uns pitches assim...
Tem alguma curiosidade dessa época aí?Quem gostava muito do que eu fazia nos anos 90 era o Gordo Miranda e o Dudu Marote. Eu inventei um personagem chamado DJ Samplitude Junior, e que era só montagem de Miami Bass, funk carioca, eu pegava umas frases de CD que tinha comprado na periferia do Rio e fazia umas loucuras. O Miranda era muito fóda, até hoje ele me pergunta "E o DJ Samplitude Junior??" (risos). Mas aí eu matei o Samplitude e criei o Chernobyl... É um ser mais evoluído, depois da mutação! (risos).
E como guitarrista na Comunidade? Quais são as influências?Angus Young e Jimi Hendrix. Eu tenho o cara de AC/CD tatuado aqui e o Jimi no outro (braço). Curto muito! Sempre no meu set tem que ter algum rock. Eu acho que tenho que colocar a minha vibe em tudo.
O que aconteceu que o grupo ficou três anos sem lançar nada desde Comunidade no Baile?A gente continuou fazendo shows pelo Rio Grande do Sul, nos fins de semana, mas, coincidência ou não, foi um período de expansão meu como produtor, sabe?! Eu me dediquei muito a produzir nesse hiato, lancei uns oito, nove discos como produtor, muitas vezes só remix, vinil... Até tem na minha biografia, o The Touch que é um grupo sueco, o RQN que saiu na Alemanha, os dois do Bonde, uma coletânea que saiu no Japão chamada Spunk Skat and Politics, pelo selo KSR, o mesmo responsável pelo CSS e o Turbo Trio lá, tem dois vinis meus, Baile Electro 1 e 2, saindo no Japão, tudo isso foi nesse período. Continuei tocando com a Comunidade e fui me aprimorando como produtor. Porque eu gosto dessa história de fazer som em casa. Sempre achei broxante a história de criar e ter de pagar um estúdio, então eu tenho um Home Studio. O Bonde mesmo a gente fez tudo em casa. E a Comunidade, esse último disco, a pré-produção foi feita em casa, depois finalizada em estúdio, porque tem música com bateria, essas coisas, que não tem jeito...
E eu acho interessante como a Comunidade NinJitsu conseguiu se adaptar a todas as revoluções do meio alternativo, de promoção, de produção, de distribuição da música. Vocês apareceram no auge da ação dos fanzines, e agora continuam em evidência no cume da cultura blogger...Pois é cara, a gente começou numa época que o negócio era "fazer a fita demo". Passávamos a tarde inteira copiando fita demo. Depois o CD-R. E agora é Web Total. O nosso MySpace tá super bem acessado, o fotolog da banda também, a gente tá fazendo que nem essas bandas novas aí, usando e abusando das ferramentas online...
Se a parada tá dando certo assim, porque resolveram prensar o disco?É que eu acho importante, o disco é uma obra. Atualmente, com essa onda toda da mp3 e tal, fica um monte de track solta que não compõe uma obra. Eu acho que banda tem que ter uma obra. Produtor, DJ, não tem problema lançar vinil, single e tal. Mas banda, nem que seja um EP, é importante, porque são as etapas da criação. Fecha um ciclo de criação. Eu consumo um disco muito rápido, imagina uma track. A gente ainda vende disco em show, a nove reais. Eu acho que a indústria faliu porque tem muito esquema de corrupção. A gravadora gastava com artista, depois pagava um caminhão de dinheiro pra rádio, aí tinha que compensar a grana do jabá no valor do disco. 100 mil de jabá pra tocar tanto. Eu acho justo que eles tenham quebrado. Porque é um meio super corrupto mesmo, é fóda. E outra, a maioria das minhas conexões com o exterior foram via MySpace, a internet abre portas que a indústria não abria. Eu acabei de remixar uma banda russa, que tem um selo chamado Aero CCCP, aquela sigla antiga da União Soviética, de Nova York, e que tá lançando só bandas russas. E eles são muito fãs de Bonde do Role, o cara achou meu profile... Mandei ontem, até, o som pros caras. Eu fiz um funk Baltimore pra eles, toda hora surge uma oportunidade. E você fica um bom tempo fazendo de graça, isso é importante, tem que trabalhar de graça pra c******, depois começa a virar grana. As pessoas podem escolher o que vão ouvir agora também, né?!
Você que fez um tour na Europa recentemente, o que tem a dizer sobre a repercussão da música brasileira por lá?Eu acho que é o Tom Jobim, o Sepultura e depois o CSS... e depois o Bonde. Ah, sei lá também (risos). Bem louco isso. É o seguinte: os meios pelos quais lanço e toco, lá fora, não têm nada a ver com essa história da nova MPB. O que eles chamam de Baile Funk é uma ramificação, uma forma suingada, do electro. A turma que consome electro é que curte, o Baltimore Style e o Baile Funk são as variações, é meio maximal a história. Eu toco em clubs, em Moscou, Kiev, em Berlin, sempre com DJs de electro. DJs pesados até. Toquei com o Shir Kan na Alemanha, super pesado, a galera curte pra caramba, é diferente, não posso falar muito. Eu acho que não é "só pra inglês ver" isso que eu faço, essa mistura, esse Baile Funk Maximal, porque tá pegando aqui também. A galera tá mais aberta lá, meus sets foram muito bem aceitos, toquei até mais tempo do que deveria. To voltando em janeiro, vou tocar em Portugal, Áustria, Alemanha e Finlândia.
E o que você tem na manga pra 2009?Tem o novo do Bonde do Role. Vai ter produções minhas, do Diplo, do Edu K também. A gente tá criando junto, eles vão lá pra Porto Alegre... Tour na Europa... E vai pintar mais remix aí pra fazer. Eu quero lançar algo meu. Eu produzo bastante pros outros, mas não existe um trabalho cem por cento autoral ainda. Quero fazer algo assim. Porque dou bastante música pra minha banda, pros artistas com quem trabalho, agora quero algo meu também. Tem material lançado, mas são White Labels, tipo exemplares que saíram no Japão... Eu nem assino, boto meu style ali e a galera chega à conclusão que sou eu. Taí algo que quero tentar fazer em 2009.
+ info
www.gentebonita.org
www.popscene.com.br
www.clubegloria.com.br
www.myspace.com/djchernobyl
Eduardo Ribeiro, textoMarcelo Nunes, foto
Fredi Endres, mais conhecido por seu codinome de guerra Chernobyl, é DJ, produtor, guitarrista da banda Comunidade NinJitsu e pioneiro no mash-up de funk carioca - a despeito de ser gaúcho - com rock. Na atividade desde 95, Chernobyl e sua banda faziam isso quando muitos ainda torciam o nariz, e, de lá pra cá, desde quando ficaram conhecidos por causa do hit "Detetive", evoluíram junto com a tendência que virou realidade.
A Comunidade acaba de lançar seu sexto álbum, Atividade na Laje, e ele também vive um momento promissor de sua carreira. Depois de uma proveitosa turnê pela Europa, está envolvido em sua segunda colaboração com o Bonde do Role (que lança disco novo em 2009), em janeiro embarca em outra tour no Velho Continente e promete a realização de um álbum autoral, além das costumeiras edits, como uma de suas próximas investidas.
Se você ainda não conferiu o som do cara ao vivo, ainda está em tempo. Nesta terça-feira (16) ele mostra todo seu talento ao público de São Paulo, no Clube Glória. Pra se ter idéia daquilo que Chernobyl usa como combustível na hora de incendiar as pistas, ele liberou uma mixtape pros leitores do Skol Beats baixarem - é só clicar aqui. A entrevista que vocês acompanham a seguir foi concedida na tarde da última quinta-feira de calor a pino, dentro de um restaurante na Oscar Freire. Uma caipirinha, por favor!
Quando começa a chamada onda neo-funk e o que ela tem de novo que a onda funk dos anos 90 não tinha?Eu acho que a grande diferença é que existem... Bem, o divisor de águas é que a galera começou a fazer música em casa de uns tempos pra cá, com a popularização do computador e do software. Uma galera que cresceu ouvindo rock, e de uns tempos pra cá música eletrônica. E acabou fazendo um funk da sua maneira, de uma forma diferente. Então eu acho que a diferença é o background desse pessoal fora do Rio que faz funk. Normalmente é um povo que cresceu ouvindo rock, e a galera do Rio é a raiz do funk mesmo. O neo-funk, ele tem influência do funk carioca, mas feito por gente que ouviu AC/DC, que ouve Soulwax, electro também. Mas os próprios DJs do Rio estão diversificando o set quando vão tocar no exterior porque o público de lá tem que se identificar, né?! Tanto que o pessoal tem feito mash-ups e bootlegs com Justice, com Black Sabbath. Neo-funk na verdade é um rótulo que a gente tentou dar pra explicar. Surgiu quando eu fui fazer uma coletânea pra Som Livre. Eu pensei "cara, que nome que vou dar pra esse funk 'não do Rio'", e eu tava trabalhando com todo mundo que vinha lançando funk fora do Rio, principalmente o Bonde do Role. Daí tem um selo lá na Alemanha, o Man Recordings, que chamou de pós-baile funk. Enfim, neo-funk, pós-baile funk, é tudo o mesmo.
E é legal que rola uma troca de influências, né?! Entre o pessoal que fazia esse funk "tradicional" e a nova escola, digamos assim, que traz as batidas do hard rock e do electro pro "movimento"...Eu acho que é interessante quando as coisas se espalham. Não é legal as coisas ficarem entocadas só no seu lugar de origem. Sany Pitbull é um cara super cabeça aberta. Faz baile funk há 23 anos e ele super troca idéia comigo já faz mais de dois anos. Faço música e mando pra ele, ele manda as dele pra mim. Os artistas mais cabeça aberta, como ele, são os caras que conseguem expandir realmente.
O funk antigamente era visto como algo tosco, essencialmente marginal, e agora já começa a ganhar tratamento cool nas matérias por aí, depois da ascensão do Bonde, do Diplo, do guetto-tech, do Sany Pitbull e até do João Brasil com aquela mixtape dele toda em cima de bases já manjadas do batidão e que ficou demais...A galera que tá perdendo o preconceito é a mais indie e mais electro. Quando eu toco em lugares com DJs de house eu tenho que maneirar no funk. O pessoal naquela vibe raver não assimila muito. Eles querem set mais instrumental e mais fritado. Eu nunca faço um set puro de funk. Faço mil mash-ups e bootlegs, e às vezes quando eu gosto de uma música, faço um remix só pra tocar. Nem lanço nem nada. Mas sempre misturando tudo... Era isso que você ia perguntar, né?! (risos).
Acho que sim (risos)... Bom, todo esse interesse que tá rolando agora é muito devido a uma coisa que a sua banda iniciou, em 95, depois quando surgiram com o hit "Detetive" em 97, esse lance de se arriscar na mistura do funk do morro com guitarra, enquanto que outros nomes do crossover, que faziam funk-o-metal, eram mais rapcore. Vocês estavam no meio desse cenário?Não, a gente só tinha relação com o De Falla que é o pai de todos. Eles são de uma geração mais velha que a gente e eu gostava muito de De Falla na adolescência. Mas eles só foram fazer funk carioca com rock depois da gente. Porque o Edu K produziu nosso primeiro disco e três anos depois ele fez "Popozuda". Muita gente achava que esse som era da Comunidade NinJitsu no sul. E o hit "Popozuda", de certa forma, foi um divisor de águas. Tinha umas guitarras pesadas e tal. Eu acho que a Comunidade foi pioneira, mas super sem querer. A gente respeitava o funk carioca, achava legal, era a batida do funk da Flórida lá, do Miami Bass, um rap muito discriminado nos Estados Unidos, que nunca foi muito bem-sucedido, só que a gente adorava. E a Comunidade nasceu disso, do funk carioca com Miami Bass da Flórida, cantado em português, e com guitarra. A gente já gostava de mistura, aquela coisa dos anos 90, Faith No More e tal, só que estávamos meio de saco cheio desse lance funk-o-metal, e o nosso funk não foi o rap, foi o funk carioca. Funk carioca com metal. Aí a gente acabou criando uma parada. Tanto que dez anos depois, eu vi o MySpace do Bonde, eles tinham duas semanas, e pensei "esses caras têm a mesma despretensão do começo da Comunidade". Aí fiz contato com eles, não conhecia pessoalmente, eles tinham uma demo, e falei: "Vamos gravar direito isso aí, vamos fazer a história".
Você acha que existe uma estética diferente pro funk original da favela e o funk que está invadindo as pistas?Eu acho que ainda existe. O pessoal que compra CDs tipo as coletâneas do DJ Marlboro, esse público não está consumindo o neo-funk. Eles continuam no tradicional. Agora, o que tá acontecendo é que o batidão tá invadindo a cena indie e a cena electro.
Qual será a aceitação do Bonde do Role nas favelas?Eu realmente não sei do público, mas posso falar dos artistas. Os DJs de funk do Rio que eu conheço acham muito legal, eles vêem como uma forma de expansão do ritmo. Algo positivo, de misturar com outros gêneros. A turma que eu conheço não tem preconceito com o fato de ficar pop, Sany Pitbull, Edgar, Amazing Clay, que é um cara das antigas, os caras são cabeça aberta e não é a toa que são eles que tão excursionando direto pela Europa.
Você curte esse tipo de som desde moleque?Eu sempre gostei da música black e do rock. Do começo dos anos 80, eu curtia os primeiros raps, Run DMC, 2 Live Crew...
...e você já tocava guitarra?Eu toco guitarra desde 85, desde que eu tinha 10 anos. E aí eu curtia as duas coisas, mas o batidão mesmo veio aparecer com a Comunidade. E eu logo comprei sampler, eu lido com programação antes do tempo de ter computador em casa. Era uma trabalheira desgraçada, dava muito mais trampo fazer som em casa, mas eu já fazia uns pitches assim...
Tem alguma curiosidade dessa época aí?Quem gostava muito do que eu fazia nos anos 90 era o Gordo Miranda e o Dudu Marote. Eu inventei um personagem chamado DJ Samplitude Junior, e que era só montagem de Miami Bass, funk carioca, eu pegava umas frases de CD que tinha comprado na periferia do Rio e fazia umas loucuras. O Miranda era muito fóda, até hoje ele me pergunta "E o DJ Samplitude Junior??" (risos). Mas aí eu matei o Samplitude e criei o Chernobyl... É um ser mais evoluído, depois da mutação! (risos).
E como guitarrista na Comunidade? Quais são as influências?Angus Young e Jimi Hendrix. Eu tenho o cara de AC/CD tatuado aqui e o Jimi no outro (braço). Curto muito! Sempre no meu set tem que ter algum rock. Eu acho que tenho que colocar a minha vibe em tudo.
O que aconteceu que o grupo ficou três anos sem lançar nada desde Comunidade no Baile?A gente continuou fazendo shows pelo Rio Grande do Sul, nos fins de semana, mas, coincidência ou não, foi um período de expansão meu como produtor, sabe?! Eu me dediquei muito a produzir nesse hiato, lancei uns oito, nove discos como produtor, muitas vezes só remix, vinil... Até tem na minha biografia, o The Touch que é um grupo sueco, o RQN que saiu na Alemanha, os dois do Bonde, uma coletânea que saiu no Japão chamada Spunk Skat and Politics, pelo selo KSR, o mesmo responsável pelo CSS e o Turbo Trio lá, tem dois vinis meus, Baile Electro 1 e 2, saindo no Japão, tudo isso foi nesse período. Continuei tocando com a Comunidade e fui me aprimorando como produtor. Porque eu gosto dessa história de fazer som em casa. Sempre achei broxante a história de criar e ter de pagar um estúdio, então eu tenho um Home Studio. O Bonde mesmo a gente fez tudo em casa. E a Comunidade, esse último disco, a pré-produção foi feita em casa, depois finalizada em estúdio, porque tem música com bateria, essas coisas, que não tem jeito...
E eu acho interessante como a Comunidade NinJitsu conseguiu se adaptar a todas as revoluções do meio alternativo, de promoção, de produção, de distribuição da música. Vocês apareceram no auge da ação dos fanzines, e agora continuam em evidência no cume da cultura blogger...Pois é cara, a gente começou numa época que o negócio era "fazer a fita demo". Passávamos a tarde inteira copiando fita demo. Depois o CD-R. E agora é Web Total. O nosso MySpace tá super bem acessado, o fotolog da banda também, a gente tá fazendo que nem essas bandas novas aí, usando e abusando das ferramentas online...
Se a parada tá dando certo assim, porque resolveram prensar o disco?É que eu acho importante, o disco é uma obra. Atualmente, com essa onda toda da mp3 e tal, fica um monte de track solta que não compõe uma obra. Eu acho que banda tem que ter uma obra. Produtor, DJ, não tem problema lançar vinil, single e tal. Mas banda, nem que seja um EP, é importante, porque são as etapas da criação. Fecha um ciclo de criação. Eu consumo um disco muito rápido, imagina uma track. A gente ainda vende disco em show, a nove reais. Eu acho que a indústria faliu porque tem muito esquema de corrupção. A gravadora gastava com artista, depois pagava um caminhão de dinheiro pra rádio, aí tinha que compensar a grana do jabá no valor do disco. 100 mil de jabá pra tocar tanto. Eu acho justo que eles tenham quebrado. Porque é um meio super corrupto mesmo, é fóda. E outra, a maioria das minhas conexões com o exterior foram via MySpace, a internet abre portas que a indústria não abria. Eu acabei de remixar uma banda russa, que tem um selo chamado Aero CCCP, aquela sigla antiga da União Soviética, de Nova York, e que tá lançando só bandas russas. E eles são muito fãs de Bonde do Role, o cara achou meu profile... Mandei ontem, até, o som pros caras. Eu fiz um funk Baltimore pra eles, toda hora surge uma oportunidade. E você fica um bom tempo fazendo de graça, isso é importante, tem que trabalhar de graça pra c******, depois começa a virar grana. As pessoas podem escolher o que vão ouvir agora também, né?!
Você que fez um tour na Europa recentemente, o que tem a dizer sobre a repercussão da música brasileira por lá?Eu acho que é o Tom Jobim, o Sepultura e depois o CSS... e depois o Bonde. Ah, sei lá também (risos). Bem louco isso. É o seguinte: os meios pelos quais lanço e toco, lá fora, não têm nada a ver com essa história da nova MPB. O que eles chamam de Baile Funk é uma ramificação, uma forma suingada, do electro. A turma que consome electro é que curte, o Baltimore Style e o Baile Funk são as variações, é meio maximal a história. Eu toco em clubs, em Moscou, Kiev, em Berlin, sempre com DJs de electro. DJs pesados até. Toquei com o Shir Kan na Alemanha, super pesado, a galera curte pra caramba, é diferente, não posso falar muito. Eu acho que não é "só pra inglês ver" isso que eu faço, essa mistura, esse Baile Funk Maximal, porque tá pegando aqui também. A galera tá mais aberta lá, meus sets foram muito bem aceitos, toquei até mais tempo do que deveria. To voltando em janeiro, vou tocar em Portugal, Áustria, Alemanha e Finlândia.
E o que você tem na manga pra 2009?Tem o novo do Bonde do Role. Vai ter produções minhas, do Diplo, do Edu K também. A gente tá criando junto, eles vão lá pra Porto Alegre... Tour na Europa... E vai pintar mais remix aí pra fazer. Eu quero lançar algo meu. Eu produzo bastante pros outros, mas não existe um trabalho cem por cento autoral ainda. Quero fazer algo assim. Porque dou bastante música pra minha banda, pros artistas com quem trabalho, agora quero algo meu também. Tem material lançado, mas são White Labels, tipo exemplares que saíram no Japão... Eu nem assino, boto meu style ali e a galera chega à conclusão que sou eu. Taí algo que quero tentar fazer em 2009.
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